terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Uma nova experiência de vida - Velório -26

          Ao ler a história de Jose Camargo Beira no site São Paulo Minha Cidade com o titulo “Um velório nos anos 50” saltou lá de dentro uma passagem semelhante ocorrida nos tempos de infância.

Meu primo e eu caminhávamos pelas ruas do nosso bairro Vila Nova Conceição, mais precisamente pela Rua Natividade, do longe notamos uma aglomeração próximo a casa de um conhecido. Na frente da casa, um amontoado de gente todas com semblantes sérios.

Movido pela curiosidade natural das crianças, resolvemos entrar para ver o que acontecia. Estava na época com oito para nove anos.

Sem chamar muito a atenção fomos entrando tentando não esbarrar em ninguém. O local mal dava pra entrar. Mas com jeitinho, ultrapassamos uma muralha de gente.

Estávamos curiosos para saber do que se tratava.

Ao romper o ultimo obstáculo, demos de cara com um caixão aberto no meio da sala com velas e flores. E dentro dele um homem magro, morto. A vontade era correr e cair fora. Mas aguentamos firme. 

Tentamos disfarçar ao máximo o nosso engano tentando fazer cara de paisagem como exigia o momento.

Era meu primeiro encontro com a morte. Até então nunca havia me deparado com aquele tipo de situação.

Como a situação era nova, ficamos observando como as pessoas se movimentavam. Diversas pessoas iam ao encontro de familiares postados ao lado do caixão para receber as condolências.

Como já estávamos na chuva resolvemos nos molhar e lá fomos oferecer nossos sentimentos.

Depois de fazê-lo demos meia volta em direção a porta para nos retirarmos.

Próximo ao portão havia uma mesinha para que os visitantes deixassem nome e endereço.

Claro que colocamos deixamos ali o nosso endereço.

Nessa época era comum realizar o velório na própria casa onde a pessoa havia falecido.

Passado alguns dias, surpreso recebo uma cartinha.

Era uma cartinha da família do falecido agradecendo a presença ao velório.

Acabei achando aquilo uma “curtição” com relação ao fato de receber cartas. Pois nunca havia recebido qualquer tipo de carta. 

Um mês depois, passando numa outra rua, reparei uma nova aglomeração mais adiante.

Sem pensar duas vezes, fomos entrando.

As pessoas nos olhavam com curiosidade, meninos tão jovens, ali participando, compenetrados no que estava ocorrendo.

Ficamos a observar tudo que acontecia. Eram choros, lágrimas , pessoas tristes que há muito não se viam. Abraços fortes.

Uma bandeja foi atravessada pela sala repleta de sanduíches e sucos. Os adultos eram chamados para sala ao lado onde eram convidados a experimentar licores.

Observamos que havia um tratamento diferente que não havíamos percebido no velório anterior.

Para quebrar um pouco a monotonia do ambiente iam surgindo anedotas e casos engraçados para espairecer a tristeza do ambiente.

Ao final deixamos nossos nomes no registro.

Neste mesmo ano, mais quatro ocorrências como as descritas acima aconteceram no bairro e lá estávamos nós para levar nosso abraço.

O lanche também era algo que já era esperado.

Ao final de um ano recebemos quase sete cartinhas de agradecimento.

Isso de alguma forma me trazia algum conforto.

Os adultos pouco explicavam a respeito. Não entendia bem o que significava a morte, mas de certa maneira me ajudou a aceitar o assunto de forma tranqüila.

Mesmo com pouco entendimento sobre o assunto, de maneira ingênua levávamos o nosso conforto “meio maroto”, a essas famílias com respeito.

Mesmo sendo crianças, aprendíamos de certa forma a encarar o sofrimento alheio.

Hoje em dia, pelos menos nas grandes cidades, os costumes são outros  raramente se faz um velório em casa.

Anos depois, estive muito perto da morte em um afogamento e de certa forma pude encarar o assunto com alguma naturalidade.    

Luigy 

17/01/2012 

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