terça-feira, 1 de maio de 2012

Domingo, dia sagrado para ir ao cinema - 47



Passei uma “boa’’ parte de minha juventude nas salas de cinemas do meu bairro a Vila Nova Conceição.

Havia duas grandes razões para isso.
Uma era re-experimentar as sensações vividas como aventura em minha primeira sessão de cinema que havia sido em uma praça pública.
Cada filme nos levava a uma viagem diferente onde não havai como prever ao certo qual seria o destino.
Cada diretor imprime a cada obra, os anseios, dúvidas, certezas e aspirações que lhe marcaram em determinado momento de suas vidas.

Uma outra razão à aquela época eram as duas horas no escurinho ao lado de uma garota.
Uma coisa era ser adulto e ter intimidades com outra pessoa adulta.

Mas aos jovens pré-adolescentes estar ao lado, junto de uma garota durante duas horas cheios de espectativas eram prazeres indiscritíveis.

Experimentar o prazer e sensações permitidas e ao mesmo tempo difíceis de concretizar, pois fazia parte de um rito de passagem para vida adulta.

Sentar-se ao lado de uma menina numa sala de cinema, acreditando-se que ambos tinham desejos parecidos, era algo que nos fazia perder a respiração e tremer nas bases.

Querer conhecer uma garota dentro do cinema, entabular conversa e sair dali levando pra casa a singela recordação de um beijo, era algo além da imaginação.
Mas isso acontecia, as vezes.

Como era escuro, mal dava pra perceber a reação de qualquer uma das partes.

Os acontecimentos seguiam por fases, que depois de um ‘conversê” bem aplicado que levaria a permissão de pegar nas mãos da graciosa menina depois de apreciar sua pulseira. Após algum tempo as mãos ficavam úmidas, suadas de tanto se apertar. Era hora então de dar uma folga para as mãos e passar para fase seguinte: colocar as mãos sobre o ombro da linda garota.

Com esse consentimento, era questão de minutos que as cabeças quisessem se aproximar.
Sutilmente a garota de olhos brilhantes repousava suas madeixas no ombro do daquele garoto que ia medindo seus passos.
Ah! Chegar até ali era um misto de estratégias, avanços, retrocessos e sucesso. Tudo muito bem dosado.

Era hora então de relaxar um pouco e aproveitar a maravilhosa sensação de ter uma futura  mulher nos seus braços cabeça a cabeça. Sentir o seu perfurme e poder recordar mais tarde.

Durante algum tempo ele ficava suspirando internamente curtindo e admirando chegar até onde chegou.
Quase no meio do filme, que de preferência deveria ter alguma coisa de romântico, era a hora de oferecer um drops ou algum doce ou chocolate.
O drops servia de experimento para que pudessem se encarar por algum momento e ouvir aquela voz meiga dizendo sim, eu quero (drops). A bala ou drops servia também para suavizar o hálito quente e esperançoso de ambos.

Assim que percebia que o drops da garota poderia estar acabando, estrategicamente o menino levava um drops a sua boca já com a pergunta engatilhada:
Vc quer mais um drops? Seguramente ela responderia que sim.

Ele gentilmente oferecia então o drops preso em seus lábios.

Geralmente atenta ao filme, ela virava levemente a cabeça com os olhos fixos na tela oferecendo seus lábios rosados esperando o drops.
Ele mais que ligeiro oferece carinhosamente o quitute com todo seu amor.

A mistura de espanto, surpresa e desejo terminavam em um beijo molhado entre ambos.
Era um beijo demorado, talvez pela incerteza ou não de acontecer novamente...

Os colegas da turma  também no cinema comemoravam como se fosse um gol na copa do mundo.

Talvez nos pensamentos da graciosa menina, não ver a hora de contar pra suas amigas, aquele beijo. E na cabeça dele acontecia uma viagem de ida e volta como se fosse uma montanha russa.

Era bem provável que se mantivessem com as cabecinhas coladas até o encerramento filme, pois o beijo representava o céu é o limite.

Eram justamente esses acontecimentos que nos levava a dizer que:
Domingo, era dia de sagrado de ir ao cinema.
E cinema era um lugar onde tudo poderia acontecer.          

              
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Na década de 60 morava no bairro de Vila Nova Conceição, na Avenida Santo Amaro, onde éramos bem servidos no quesito de cinemas.

Em seu trecho inicial haviam cinco salas de exibições: 
O Cine Graúna-1960 (depois Chaplin), Cine Guarujá (Excelcior), Cine Bruni Vila Nova -1966 ( Cinelândia II), Cine Vila Rica-1963 (Del Rey) e Cine Radar.
E bem perto dali, na rua Joaquim Floriano havia o cine Iguatemi.
No Brooklin havia ainda o Cine Meninópolis.    
Entrando na adolescência, não perdia uma só matinê.
Com tal variedade de salas, as vezes dava até pra escolher.

Nessa época, os meninos andavam à caça nas matines especificamente para arrumar alguma namorada. Tentar fazia parte do jogo. Os resultados nem sempre satisfatórios.

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